segunda-feira, 30 de julho de 2012

Quando a gente levanta as mãos

Quando a gente vê alguém levantar as mãos, logo pensa que está se rendendo.
Não foi isso ontem, na porta das siderúrgicas de Piquiá de Baixo, profundo interior do Maranhão.
Cerca de cem pessoas estavam de mãos levantadas e sujas, parando os caminhões de carvão e minério de ferro que queriam entrar, para alimentar a fome incandescente dos fornos das guseiras.
Eram jovens de Parauapebas, Marabá, Canaã dos Carajás, Açailândia, Bom Jesus das Selvas, Buriticupu. Eram idosos e doentes do Piquiá, gritando de novo com voz humilde e cansada, mas firme, contra aquela poluição que respiram a cada dia.
Juventudes e comunidades atingidas pela mineração e sua cadeia produtiva estavam encerrando mais um encontro regional de estudo.
Os moradores levaram um saco do pó preto que cai dia e noite dentro de suas casas; os jovens sujaram as mãos e as levantaram, envergonhados e solidários, em denúncia. Tem gestos que falam mesmo com seu silencio: dezenas de jovens, idosos e crianças mostrando suas mãos e esbarrando o caminho.
Era um basta à violência ambiental, um bloqueio ao fluxo agressivo do lucro, que passa por cima de direitos e vidas.
Lembro de um gesto desse tipo mais de dez anos atrás, no grande encontro dos G8 em Genova, na Itália. Manifestantes levantavam suas mãos, pintadas de branco, para bloquear as incursões violentas da polícia e dos black-blocks terroristas. Hoje é outra violência, igualmente mortal, que nos obriga a sujar as mãos de pó preto.
Uma das estratégias da luta não-violenta é envergonhar publicamente o adversário. Eu senti vergonha, ontem, quando um morador do bairro poluído, em sua simplicidade, desabafava no microfone: “a gente pede justiça às siderúrgicas e elas dizem que precisa falar com a Vale; a gente denuncia a Vale e ela diz que a responsabilidade é das siderúrgicas... vai ver que agora os culpados de tudo isso somos nós!”
Com certeza, de hoje para frente, muito mais pessoas assumiram essa causa. Uma voz, cantando ao longo do ato, perguntava: “Quem é você?”. E dezenas de jovens, crianças e outros moradores gritavam em resposta: “Sou Piquiá!”.
Somos todos Piquiá, de mãos levantadas, não para nos render, mas em denúncia, pedindo respeito, exigindo que a corrida louca do progresso pare para nos escutar!

padre Dário Bossi
Missionário Comboniano e pároco em Açailândia

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