terça-feira, 10 de junho de 2008

Derrota da vida

Após várias vitórias da bioética, que anunciamos em artigo dias atrás, ao findar o mês de maio último, uma clamorosa derrota abateu-se sobre o direito à vida dos seres humanos. A decisão de seis ministros do STF, contra cinco, estabeleceu como constitucional a destruição de embriões humanos para fins de pesquisa científica e terapêutica no País. Para tentar ganhar a simpatia da população ao pretenso direito, houve campanha na mídia, indicando como resultado das pesquisas com células embrionárias a cura de doenças degenerativas. A propaganda escolheu pessoas com deficiências físicas, que em suas cadeiras de rodas foram mostradas confiantes que tal pesquisa seria a solução de seus problemas. Também utilizou-se do discutível argumento de que a maioria dos países europeus já aprovaram tais pesquisas com células embrionárias e que o Brasil, se não o fizesse, estaria em atraso.
Após a aprovação do STF, por diferença de apenas um voto, fica a pergunta: as células embrionárias são mesmo milagrosas como dizem?
Responde a ciência. O Dr.Thompson, iniciador de tais experimentações nos Estados Unidos, já abandonou, faz tempo, tais pesquisas, porque não vê nelas nenhum futuro. Os países europeus que já aprovaram a pesquisa, alguns tendo o hipócrita cuidado de não destruir embriões de seus cidadãos, mas comprando embriões estrangeiros, não apresentaram, em dez anos, um caso sequer de cura nas experimentações em animais, o que impossibilitou até hoje a aplicação do método em seres humanos. Na verdade, a utilização de células embrionárias só gerou, até hoje, teratomas, ou seja, tumores.
Por outro lado, a pesquisa com células tronco adultas, tiradas de partes do corpo humano já desenvolvido, tem sido aplicada com sucesso e já beneficiou mais de vinte mil casos de pessoas com doenças degenerativas. As pesquisas nos Estados Unidos e no Japão já estão tão avançadas, que apresentam a possibilidade de modificar células adultas de forma tal que tenham comportamento das células embrionárias, o que não fere, de nenhuma forma, a ética.
Daí, uma pergunta é inevitável aos brasileiros: por que então matar embriões, se a pesquisa com células adultas é eficiente e promissora? Ao lado de cadeirantes que deram depoimentos favoráveis à pesquisa com células embrionárias, havia e há um número não inferior de cadeirantes que dão depoimento contrário, confiantes nos dados científicos sobre células adultas, e prontos a dizer ‘não’, até mesmo se as embrionárias fossem resposta, pois, em consciência, não desejam a morte de seres humanos para seus benefícios particulares. Mas estes últimos cadeirantes não foram mostrados pela mídia e nem lhes foi dada a palavra, o que põe em risco os direito democráticos.
A decisão do STF tem conseqüências muito mais desastrosas que apenas a decepção de certa classe de cadeirantes, uma vez que os senhores que votaram a favor da destruição de embriões nunca poderão oferecer-lhes, como prometido, a cura. Abre-se um precedente em relação ao direito do nascituro, deixando de considerar o embrião como ser humano, tratando-o como ‘coisa’. É a ciência que está em jogo. Ela demonstra em todos os seus livros respeitáveis do ponto de vista médico que a vida humana começa na fecundação. Portanto, a partir do referido momento, o ser humano existe e tudo o que ele será já está definido naquelas células iniciais. Daí para frente, não há nenhum momento em que se poderia dizer: até aqui não há vida humana, daqui para frente se torna vida humana. Uma tal reflexão geraria as mais acirradas disputas entre opiniões divergentes e ninguém, em sã consciência, pode negar que a formação de todos os órgãos – cérebro, nervos, coração, pulmões etc – já está inteiramente definida no momento da fecundação.
Em Nota que a CNBB fez tão logo se publicou a desastrosa decisão dos seis ministros do STF, diz : “Sendo uma vida humana, segundo asseguram a embriologia e a biologia, o embrião humano tem direito à proteção do Estado. A circunstância de estar in vitro ou no útero materno não diminui e nem aumenta esse direito. É lamentável que o STF não tenha confirmado este direito cristalino, permitindo que vidas humanas em estado embrionário sejam ceifadas.”
O fato de ter sido uma votação tão polêmica e ter havido resultado tão insignificante do ponto de vista democrático, com somente um voto de diferença, denuncia a gravidade da medida e põe o Brasil, aqui sim, em estado de atraso na evolução das questões éticas de nosso tempo. O futuro o mostrará. Quem viver verá.

Dom Gil Antônio Moreira
Bispo de Jundiaí-SP-Brasil

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